quinta-feira, agosto 11, 2011

Canal do antigo mangue

Retomo os trabalhos desse espaço, para fazer uma sugestão às autoridades. Sugiro que retirem a palavra mangue do canal que rasga de uma ponta a outra o coração da cidade maravilhosa, uma vez que nunca consegui identificar nele, sequer vestígios de vegetação desse farto ecossistema, outrora denominado Saco de São Diogo. Como podemos facilmente identificar, o que restou foi apenas um 'valão' canalizado que carrega, entre os mais variados detritos (defuntos, sofás, etc), esgoto a céu aberto.
Foto tirada em 2010 (Jornal O Dia)
A canalização de 1176m do que restou do Estuário de São Diogo, obra encomendada pelo imperador ao Barão de Mauá, iniciada em 1857 e inaugurada em 1860, representou, segundo os lusitanos, a maior obra de saneamento da época. Afinal de contas, ora pois pois, na opinião deles, seria necessário dessecar as áreas alagadiças que ocupavam naturalmente grandes extensões daquela região - alguém ainda duvida do aspecto natural das atuais e frequentes enchentes na Praça da Bandeira? – e significavam, também segundo os portugas, apenas focos de doenças, mosquitos e exalações desagradáveis. A partir dessa premissa, foi escavado o canal pra despejar toda aquela água na, ainda exuberante, Baia de Guanabara.

 
Segundo pesquisadores que estudam a região, o Saco de São Diogo consistia em um extenso braço de mar, bastante largo em sua embocadura, estreitando-se progressivamente ao seu interior. Recebia a contribuição de diversos rios, entre eles o Iguassú (atual Rio Comprido), o Maracanã e o Catumbi. Os extensos manguezais, denominados pelos nossos queridos colonizadores de Pântano de São Diogo, possuíam uma extensão de 8 Km2, atingindo à direita o atual Campo de Santana - um antigo terraço de areias marinhas, elevado em relação aos mangues – e à esquerda a atual Praça da Bandeira, seguindo como alagadiço até a Tijuca, que aliás tem esse nome oriundo da palavra tejuco (brejo em tupi). Ancorada ao Morro de São Diogo, de um lado da boca do estuário e região da atual (futura ex) Rodoviária Novo Rio, existia uma praia arenosa chamada Praia Formosa, enquanto na outra margem existia a Praia de São Cristovão, ocupando a região onde hoje funciona o Cemitério do Caju.
Há pouco menos de 2 meses, foi publicada uma matéria em um jornal carioca, noticiando que os tempos de abandono da região estavam com os dias contados, pois já foi escolhido um projeto para a revitalização da área da Leopoldina, visando as olímpiadas de 2016 . Dentre os benefícios que serão deixados como o grande legado dos Jogos, segundo o nosso idolatrado prefeito, estão um hotel cinco estrelas de 45 andares, 500 quartos e 150 m de altura, entre outros prédios que ocuparão extensos terrenos concentrados, principalmente, na Av. Francisco Bicalho, pavimentação que margeia o atual canal.
Não queria nem tocar nesse assunto, mas essa inconveniente tarefa de falar de dinheiro tornou-se inevitável diante dos resultados das pesquisas por mim realizadas aqui na grande rede. O financiamento de toda essa ""revitalização"" seguirá o mesmo modelo utilizado no sambódromo e na vila olímpica de 2016. Na passarela do samba carioca, a AMBEV pagará a conta da reforma, e em contrapartida, terá o direito de erguer um prediozinho comercial de 26 andares no local. Já no segundo caso – o da vila olímpica – a construtora Carvalho Hosken financiará (são tão bonzinhos né?) a construção de toda a vila e, depois de 2016, poderá negociá-la como empreendimento imobiliário. A desculpa da prefeitura para aproveitar esse "momento mágico" que a cidade vive, é que incentivando o investimento da iniciativa privada, o dinheiro público poderá ser canalizado para obras de infraestrutura (leia-se algum banco nas Ilhas Cayman).

Dentre as inúmeras vantagens apontadas pelos nossos governantes, não foi possível ler em nenhuma linha algo relacionado com a mitigação de problemas ambientais. Se existe essa preocupação, ela está guardada a 7 chaves.
 



 

sábado, janeiro 01, 2011

Lago Azul e engarrafado.

  
Após tanto tempo de inatividade, e aproveitando o gancho de um novo ano que se inicia, venho demonstrar minha preocupação sobre uma questão que envolve diretamente a substância essencial à vida: a Água.

Os temores (meu e de milhões de outras pessoas) de que a água se tornasse uma commodity (mercadoria em estado bruto, produzidas em grande quantidade, por diferentes produtores, possuindo cotação e 'negociabilidae' nas bolsas de mercadorias) estão se confirmando. Um polêmico projeto de exportação de água que tem como fonte de 'matéria-prima' o Blue Lake, um lago localizado na cidade de Sitka, Alasca (EUA), com águas tão puras que sequer precisam ser tratadas para serem bebidas, pode estar representando o ponta pé nicial de uma modalidade de negócio que vai totalmente contra os príncipios de sustentabilidade.

Duas empresas pretendem tirar do 'Lago Azul', nos próximos meses, cerca de 320 milhões de litros de água, que serão transportados de navio até uma fábrica na Índia, onde a água será engarrafada e vendida para o mercado local (os rios da Índia estão criticamente poluídos) e também a países do Oriente Médio, locais que naturalmente sofrem com a escassez desse imprescindível recurso.

Uma das empresas, a True Alaska Bottling, comprou o direito de explorar 10.9 bilhões de litros de água por ano, o que pode gerar para os cofres da pequena cidade de Sitka (de apenas 10 mil habitantes) até U$ 90 bilhões (=R$ 149,4 bilhões) por ano, dependendo das vendas.

Já a outra empresa, a S2C Global Systems, ficou responsável pela construção de um mega porto na costa sul da Índia, onde a água será recebida, armazenada, engarrafada e distribuída.

Não quero colocar aqui aquela já batida porcentagem de disponibilidade de água doce no planeta, mas fica a pergunta: quando vamos entender que a água não é um recurso infinito?