Retomo os trabalhos desse espaço, para fazer uma sugestão às autoridades. Sugiro que retirem a palavra mangue do canal que rasga de uma ponta a outra o coração da cidade maravilhosa, uma vez que nunca consegui identificar nele, sequer vestígios de vegetação desse farto ecossistema, outrora denominado Saco de São Diogo. Como podemos facilmente identificar, o que restou foi apenas um 'valão' canalizado que carrega, entre os mais variados detritos (defuntos, sofás, etc), esgoto a céu aberto.
Foto tirada em 2010 (Jornal O Dia) |
A canalização de 1176m do que restou do Estuário de São Diogo, obra encomendada pelo imperador ao Barão de Mauá, iniciada em 1857 e inaugurada em 1860, representou, segundo os lusitanos, a maior obra de saneamento da época. Afinal de contas, ora pois pois, na opinião deles, seria necessário dessecar as áreas alagadiças que ocupavam naturalmente grandes extensões daquela região - alguém ainda duvida do aspecto natural das atuais e frequentes enchentes na Praça da Bandeira? – e significavam, também segundo os portugas, apenas focos de doenças, mosquitos e exalações desagradáveis. A partir dessa premissa, foi escavado o canal pra despejar toda aquela água na, ainda exuberante, Baia de Guanabara.
Segundo pesquisadores que estudam a região, o Saco de São Diogo consistia em um extenso braço de mar, bastante largo em sua embocadura, estreitando-se progressivamente ao seu interior. Recebia a contribuição de diversos rios, entre eles o Iguassú (atual Rio Comprido), o Maracanã e o Catumbi. Os extensos manguezais, denominados pelos nossos queridos colonizadores de Pântano de São Diogo, possuíam uma extensão de 8 Km2, atingindo à direita o atual Campo de Santana - um antigo terraço de areias marinhas, elevado em relação aos mangues – e à esquerda a atual Praça da Bandeira, seguindo como alagadiço até a Tijuca, que aliás tem esse nome oriundo da palavra tejuco (brejo em tupi). Ancorada ao Morro de São Diogo, de um lado da boca do estuário e região da atual (futura ex) Rodoviária Novo Rio, existia uma praia arenosa chamada Praia Formosa, enquanto na outra margem existia a Praia de São Cristovão, ocupando a região onde hoje funciona o Cemitério do Caju.
Há pouco menos de 2 meses, foi publicada uma matéria em um jornal carioca, noticiando que os tempos de abandono da região estavam com os dias contados, pois já foi escolhido um projeto para a revitalização da área da Leopoldina, visando as olímpiadas de 2016 . Dentre os benefícios que serão deixados como o grande legado dos Jogos, segundo o nosso idolatrado prefeito, estão um hotel cinco estrelas de 45 andares, 500 quartos e 150 m de altura, entre outros prédios que ocuparão extensos terrenos concentrados, principalmente, na Av. Francisco Bicalho, pavimentação que margeia o atual canal.
Não queria nem tocar nesse assunto, mas essa inconveniente tarefa de falar de dinheiro tornou-se inevitável diante dos resultados das pesquisas por mim realizadas aqui na grande rede. O financiamento de toda essa ""revitalização"" seguirá o mesmo modelo utilizado no sambódromo e na vila olímpica de 2016. Na passarela do samba carioca, a AMBEV pagará a conta da reforma, e em contrapartida, terá o direito de erguer um prediozinho comercial de 26 andares no local. Já no segundo caso – o da vila olímpica – a construtora Carvalho Hosken financiará (são tão bonzinhos né?) a construção de toda a vila e, depois de 2016, poderá negociá-la como empreendimento imobiliário. A desculpa da prefeitura para aproveitar esse "momento mágico" que a cidade vive, é que incentivando o investimento da iniciativa privada, o dinheiro público poderá ser canalizado para obras de infraestrutura (leia-se algum banco nas Ilhas Cayman).
Dentre as inúmeras vantagens apontadas pelos nossos governantes, não foi possível ler em nenhuma linha algo relacionado com a mitigação de problemas ambientais. Se existe essa preocupação, ela está guardada a 7 chaves.